Verborragia, cenários simples, pouco dinheiro, um diretor estreante. Há uma redução um tanto cômoda nessas palavras, é fato, mas elas descrevem bem a noção que se deve ter antes de decidir encarar Apenas o Fim, estreia na direção de Matheus Souza, estudante de cinema da PUC, num projeto da própria faculdade.
A premissa é fantasiosa mas não menos comovente: “eu vou embora de vez, você nunca mais vai me ver”, diz a garota ao namorado. E aí, nos próximos 80 minutos, eles discutem deus e o diabo, laranjas, cadarços e champagne. Parece monótono, mas não é.
O caminho escolhido por Matheus, além de não muito original, é bastante perigoso. Com habilidade para não soar intelectual demais, pendendo para Woody Allen (em Noivo Neurótico, Noiva Nervosa), nem romântico demais, mais ao estilo Richard Linklater (em Antes do Amanhecer), sua narrativa é uma despretensão pretensiosa, como queria Truffaut (em Beijos Proibidos)– que também era papo-cabeça e sensorial. Sabe aquelas besteiras que se fala quando se está apaixonado e descobrindo alguém? E as piadas que só são engraçadas a dois? É com essas bobagens e suas cenas inesquecíveis que o roteiro trabalha.
As referências, portanto, são bem óbvias. Reparem, contudo, que são todas estrangeiras. E aí o filme ganha uma nuance especial: cinema instrospectivo e verborrágico pouco se faz atualmente no Brasil. Exceção – também óbvia – feita a Domingos de Oliveira, o cineasta que, de tão obcecado pelas relações, fez um filme que se chama Amores e outro que se chama Separações, um logo após o outro. Oliveira não se cansou de encher o aprendiz de elogios, depois da estreia de Apenas o Fim no Festival do Rio 2008. A diferença é que Matheus não é rebuscado e, ao invés das citações intelecutais, apela para a empatia com o público através das lembranças pop: He Man, Fanta Uva.
Formalmente, o filme poderia ser mais redondo. Falta um certo tratamento da imagem, com cara de HD demais, e um cuidado maior com a direção de arte. Mesmo assim, algumas sequências se sobressaem, principalmente quando chegam nos planos próximos e closes. As emoções, apesar de obscurecidas pelo humor na maior parte do tempo, aparecem nessas horas, em planos bem pensados.
Por dois motivos vale a referência a Matheus Souza no nosso cinema recente: com pouco, o rapaz mostrou que é um bom condutor de narrativas – apesar da já citada pouca originalidade quanto ao tema. Além disso, a escolha de Gregório Duvivier para protagonista revelou uma caracterização perfeita e fugiu do chavão de atores-diretores que “se” vivem na ficção – como Woody Allen e o próprio Domingos de Oliveira. É um filme honesto porque se auto-explica, na fala de Tom: “falar que falar sobre amor é muito clichê é que é clichê”.
Ficha técnica:
Título original:Apenas o Fim
Gênero:Comédia Dramática
Duração:01 hs 20 min
Ano de lançamento:2009
Direção: Matheus Souza
Roteiro:Matheus Souza
Produção:Mariza Leão e Júlia Ramil
Música:Pedro Carneiro
Fotografia:Júlio Secchin
Direção de arte:Gabriel Cabral e Júlia Garcia
Figurino:Tatiana Pomar
Edição:Júlio Secchin
Estúdio:Atitude Produções
Distribuidora:Filmes do Estação
Excelente resenha. Não conheço o filme mas me criou ansiedade por vê-lo. Fico feliz todas as vezes que leio sobre cinema nacional fora da estética da pobreza/fome. Vou atrás!
Muito bacana Tati! Adorei a crítica. Eu não vi o filme, infelizmente. Saiu de cartaz antes que eu tivesse tempo de ir… Uma pena que os cinemas daqui sejam tão comerciais e deem pouco espaço para filmes como esse.
Não entendo de cinema a fundo como você, mas pelo que li e vi do filme (assisti o trailer, li outras críticas…) vale muito assistí-lo. Matheus Souza é um cara que tem futuro. Com ou sem originalidade, é um filme que quero muito ver. Pelo roteiro, pelo Duvivier e porque já me disseram que se parece muito comigo. =)
E o mais legal é que as tais referências à cultura pop devem trazer uma baita nostalgia…
=*
Cara Tati, achei interessante a descrição do filme…aliás, bastante clara para mim que sou apenas um telespectador das obras “vendidas” neste mercado cinematográfico. Gostei também das comparações…só assim, consigui vislumbrar, mesmo que virtualmente, o filme descrito. Parabéns…
Poxa, Tati. A crítica ficou ótima. Fiquei até com inveja de escrever assim, tão redondinho. Por isso tô achando que foi até melhor você ter escrito, eheheh – mas pelo menos eu comento, já que você não comentou nos meus! =P
Gostei de você fazer a relação com Liklater e Truffaut, já que niguém faz, ficam se atendo a Woody. E gostei mais ainda de você falar do Domingos. Eu realmente não conhecia esse cara antes de você falar. My bad. Aliás, eu continuo não conhecendo, ó! Preciso ver esses filmes. Me fala aonde você viu pra eu pegar também.
Bom, dei uma pausa no comentário para procurar fotos do Matheus para pôr no Listal (http://www.listal.com/director/matheus-souza) e jogá-lo na lista de diretores ‘to keep one eye on’ – aliás, você iria gostar do Listal, eu acho. Na busca esbarrei numa matéria da Bravo escrita pelo Domingos aonde ele menciona Linklater! Você a leu? Aqui: http://bravonline.abril.com.br/conteudo/cinema/cinemamateria_407163.shtml (vou tentar acompanhar o blog dele deposi dessa).
Daí, em outra matéria (http://www.estadao.com.br/noticias/tecnologia+link,como-fazer-um-filme-antes-dos-20,2798,0.shtm), do Estadão, vi que ele juntou dinheiro a partir da rifa de uma garrafa de uísque! Que filho da p…Que inveja! E isso com 20 anos! (Opa e aqui tbm vi Linklater). Essa matéria também me mostrou outro fato interessante: a razão de Matheus só ter filmado dentro da PUC, que era a exigência da universidade para ceder os equipamentos. Nesse sentido, achei genial a sequência final aonde pego as palavras emprestadas de Domingos: “a namorada vai embora, deixando a câmera e o namorado dentro dos portões da PUC”.
Bom, no mais, acho que você abordou melhor do que eu faria, inclusive resumindo ao necessário o meu comentário sobre os suportes.Parabéns! =]
Apenas o fim foi o seu recomeço pra valer, hein, Tatiana? Texto excelente e preciso. Eu também não consegui ver, mas irei fazê-lo dentro em breve, principalmente após essa comparação com o meu adorado Truffaut.
É um belo filme mesmo. Um dos problemas dele é que “Apenas o Fim” tem um público limitado. Pessoas com mais de 35, 40 anos tendem a não gostar – até por não entenderem tanto as referência “infância anos 90/80” que o longa faz.
Mas, para um diretor estreante, é surpreendente. Deu inveja.
Eu não gostei do filme! Achei tudo muito infantil, muito clichê… muito inexpressivo.
Também concordo com a Flor, achei o filme muito fraco…rodeado de clichês cults, além do mais os personagens são horríveis, planos que só vomitam falas claramente pensadas e cheias de referências….Falta espontaneidade, falta simplicidade, falta coisas humanas, falta vida real…