Todo ano é o mesmo roteiro. Começa com Sundance, passa por Berlim e termina em Cannes a temporada de prêmios que mais me agrada. Não escondo pra ninguém que gosto mesmo é daqueles filmes que muita gente considera chatos, com um ritmo e um tom diferentes e que nas locadoras – as que ainda sobrevivem – estão cadastrados como “de arte”. Filmes que fogem da fórmula e nos mostram como este mundo é diverso.
Mas não escondo também que acompanho com certa ansiedade a temporada que rola lá por Hollywood. Globos de Ouro, PGA, SAG, DAG, Oscars. Ansiedade provocada pela superexposição que esses prêmios recebem por parte da imprensa, claro, mas particularmente porque todo fevereiro é a mesma coisa: saem os indicados e geralmente os filmes mais elogiados do ano anterior ainda não chegaram aos nossos cinemas. Este ano, como alguns dos filmes estão em cartaz em Natal, e como outros eu obterei por vias escusas (obrigada, Vítor!), resolvi fazer um apanhado do que andei vendo. A abordagem vai ser rápida, pra cobrir a maior gama possível, como os indicados a filme estrangeiro e documentário, mas espero que acompanhem!
As Aventuras de Pi (Life of Pi, dir. Ang Lee)
A história do garoto que vivia num zoológico na Índia, sofre um naufrágio com a família e sobrevive em um bote com uma zebra, uma hiena, um orangotango e um tigre de bengala chamado Richard Parker, resgata uma narrativa há algum tempo relegada aos filmes infantis em Hollywood – a fábula. Ang Lee fez um filme de ação misturado com suspense e drama, mas o forte de As Aventuras de Pi são as simpáticas atuações de Irrfan Khan e Suraj Sharma e a condução da narrativa, que consegue nos fazer parar para ouvir uma história surreal (só aparentemente), com uma moral interessante. Foi indicado a 11 Oscars, incluindo melhor filme e melhor direção para Ang Lee. Eu fiquei achando que não é para tanto.
Lincoln (Lincoln, dir. Steven Spielberg)
As cenas iniciais de Lincoln não escondem: o filme toma partido, defendendo com todos os recursos de Spielberg já conhecidos – música pra chorar, discursos libertários recitados por um soldado negro e contraluzes no rosto de Daniel Day-Lewis – os meios utilizados pelo então presidente norte-americano Abraham Lincoln para conseguir a aprovação da emenda que acabou com a escravidão nos Estados Unidos. Mas mais que dar uma aula de política ao mostrar todos os detalhes de uma longa negociação entre o Executivo e o Parlamento para a aprovação de uma emenda à Constituição (oi, Mensalão), o filme, apesar de cansativo para muitos, se revela na construção do protagonista. Construção elogiável não só pelo mérito de Daniel Day-Lewis (que relutou por sete anos a aceitar o convite de Spielberg por não se achar capaz para o papel) mas pelo intrigante roteiro de Tony Kushner (baseado em biografia de Doris Kearns Goodwin) que deixa apenas rastros de uma personalidade ambígua para que o espectador junte os pontos. Indicado a 12 Oscars.
O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, dir. David O. Russell)
Silver Linings Playbook é o “bonitinho” do Oscar. Apesar de tangenciar, com coragem, a causa dos transtornos de comportamento que andam tão na moda (bipolar, ansiedade), o filme é uma bela reinvenção dos dramas românticos com os queridinhos atuais da América. Seu forte, no entanto, é a comédia, que dá à obra os momentos mais memoráveis e os personagens mais interessantes. Robert de Niro, como o pai do protagonista, é um caso à parte. Apesar de repetir um papel que tem feito à exaustão, o do pai controlador e neurótico, sua atuação parece conduzir todo o elenco nas cenas coletivas de humor. Faz rir e chorar, e foi indicado a 8 Oscars (incluindo o de melhor ator coadjuvante para de Niro, lembrado depois de 21 anos sem indicações).
Últimos comentários