Carnaval passou e a contagem regressiva para a grande festa da Academia está se aproximando do fim. Nos últimos dias vi dois filmes com agentes da CIA como protagonistas e um drama europeu difícil de digerir. Vamos a mais três indicados ao Oscar de melhor filme?
A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, dir. Kathryn Bigelow)
Este para mim é um dos roteiros mais impressionantes entre os concorrentes na atual temporada de prêmios de Hollywood. Zero Dark Thirty teve sua premissa extraída de uma reportagem de Mark Boal, jornalista/roteirista que também trabalhou com Kathryn Bigelow no premiado Guerra ao Terror. Boal conta aqui a extraordinária história de uma agente da CIA que, durante oito anos, perseguiu uma pista aparentemente sem importância obtida num interrogatório com um prisioneiro sob tortura, e que a levou, ao cabo, à casa onde estava escondido Osama Bin Laden. Vocês podem dizer: ok, esse tipo de filme feito pela Bigelow eu já vi. Mas não menosprezem A Hora Mais Escura. Fala de uma mulher teimosa e perseverante, e do quanto o mundo é feito mais por assessores/especialistas e menos por governantes no poder. A amenizada que a diretora dá na tortura praticada pela CIA é até tolerável. (Ao final, tenta nos convencer de que ela terminou com o governo Obama. Alguém acredita?)
Argo (Argo, dir. Ben Affleck)
Este filme está sendo responsável por uma das disputas mais peculiares do Oscar deste ano. Isso porque Argo foi indicado ao Oscar de melhor filme, e Ben Affleck ficou de fora das indicações de melhor direção, apesar de estar levando todos os prêmios dos sindicatos que reúnem votantes no Oscar – incluindo o de melhor diretor por seu próprio sindicato. Talvez presenciemos no dia 24 de fevereiro uma situação que só ocorreu três vezes na história da Academia: a de um vencedor na categoria de filme sequer ter sido indicado na categoria diretor. O Chico Fireman explica o imbróglio aqui.
Mas e o filme? Trata-se da recriação de episódio que ocorreu em 1979/80, no Irã, quando funcionários da embaixada americana se tornaram reféns por revolucionários que queriam que os Estados Unidos devolvessem o xá Pahlevi, tirano que recebeu asilo em Nova York. Seis funcionários fogem do cerco e se instalam na casa do embaixador do Canadá. O trabalho do personagem de Affleck, o agente Tony Mendez, é retirar os 6 americanos vivos do Irã sem que sejam reconhecidos como os funcionários da embaixada. E aí entra uma tática surreal: eles criam a produção de um filme – que nunca será filmado – para ludibriar os iranianos e retirar os americanos como se fossem parte de uma equipe canadense. O episódio em si é curioso e o suspense que se cria em torno da resolução da história é sufocante, mas confesso que considero o primeiro filme dirigido por Affleck bem superior. Medo da Verdade (Gone, Baby, Gone) tem um roteiro intrincado e de resolução inovadora. E até seu segundo filme, Atração Perigosa (The Town), tem uma direção encorpada pela familiriadade com que Affleck tratou de problemas do próprio bairro onde foi criado. Talvez a Academia não esteja tão equivocada assim.
Amor (Amour, dir. Michael Haneke)
Amor é a zebra da categoria melhor filme, já que é um filme austro-franco-alemão, de um diretor difícil, e que normalmente seria indicado apenas ao prêmio de melhor filme estrangeiro – como de fato foi. Mas Amor tem feito uma carreira importante em grandes festivais, já que levou a Palma de Ouro em Cannes 2012, o prêmio de melhor filme no Bafta (o Oscar britânico) e prêmios de filme estrangeiro em Toronto e no Globo de Ouro.
É um filme pesado, que fala de um casal de idosos até então bastante ativos e que precisa lidar com todas as limitações que a mulher passa a vivenciar no cotidiano depois de ter um ataque cardíaco e começar a definhar em função da velhice. Um choque de realidade sobre o envelhecimento, mas ouso dizer que é só isso. Os americanos fizeram um filme tão reflexivo quanto este sobre o mesmo assunto – Longe Dela, de 2006 – e os argentinos um bem mais lírico – O Filho da Noiva, de 2001. É um longa sofrido, como todos os outros de Haneke, e muito me admira que Hollywood tenha decidido indicar este ao Oscar de melhor filme, e não A Fita Branca, outro exemplar do diretor indicado ao prêmio de filme estrangeiro, em 2010 (será que a idade média dos votantes da Academia diz algo sobre isso?).
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